Resenha Crítica – Por Betina Menegaz Acerbi, associado Trainee do Instituto Líderes do Amanhã
O livro “As seis lições” publicado inicialmente em 1979, foi uma incrível surpresa, assuntos economicamente complexos foram abordados por Mises com clareza e fácil compreensão à luz do liberalismo. Livros com essa natureza possuem força de influência, especialmente no público jovem. Se tratando da ideologia de Mises, dispomos nesse livro de um construtivo material de prestígio e evolução social.
Corrobora a estima da obra a reputação do autor austríaco, Ludwig Heinrich Edler von Mises, escritor economista e filósofo que demonstrou em sua vida pessoal exemplos ao encontro de seus princípios, como a recusa de certas propostas de emprego e a busca constante de aprimoramento.
Margit, esposa de Mises, foi a grande incentivadora da publicação em formato de livro das palestras ministradas por Mises na Argentina em 1959. Seu trabalho em compila-las sem dúvida foi fundamental.
O livro é organizado em seis capítulos, que foram as seis palestras e são as seis grandes lições. Sendo o primeiro Capitalismo, seguido de Socialismo, Intervencionismo, Inflação, Investimento Externo e, por último, Política e Ideias, afinal “ideias, somente ideias, podem iluminar a escuridão”.
É interessante a forma como o tema capitalismo é inicialmente abordado pela sua ascensão, com comparativos históricos que elucidam em como nunca tivemos uma melhoria da qualidade de vida de forma tão rápida e abrangente.
Podemos considerar como marco o fim do poder autoritário da monarquia e seus reinados, que deram lugar a cidadãos com escolhas e possibilidades de ascensão independentes de sua origem, uma nova oportunidade em um contexto que o cenário social em nada proporcionava.
Tendo como o princípio básico do capitalismo a produção em massa, essa produção foi inicialmente viabilizada por uma parcela social que, sem bens ou trabalhos, criaram grupos de pequenos negócios e possibilitaram que artigos antes considerados exclusivos e limitados, passassem a ser baratos e acessíveis a um número maior de pessoas.
Esses grupos criaram um cenário, em que cada homem conquista o direito de servir melhor e/ou a menor custo, possibilitando melhores condições de sustento à melhores condições de vida, que culminam no crescimento da população mundial.
O livro também elucida como, desde o início, o sistema capitalista sofreu críticas e ataques, no primeiro momento pela nobreza e aristocracia. A eminente ascensão de capital de pessoas fora do mesmo grupo social e a fuga do campo para as melhores condições proporcionadas nas cidades, por conta dos salários oferecidos, constituíam evidentemente uma ameaça aos seus privilégios tão-somente herdados.
Mises esclarece como, no capitalismo, o empregador e o empregado “se tornam a mesma pessoa”, considerando que ambos são consumidores e possuem liberdade para empreender, cabendo ao consumidor ditar o sucesso de cada negócio, num cenário em que não há “proteção” para ineficiência. Somente por meio dessa nova dinâmica tivemos a prosperidade de diversas inovações, que elevaram o capital investido dos indivíduos e, proporcionalmente, maior prosperidade em cada sociedade.
Seria o sistema antagônico ao capitalismo, o socialismo, abordado no segundo capítulo do livro. Enquanto no primeiro cenário se destaca a liberdade e não “imperatividade” nos negócios, no socialismo temos apenas duas figuras: o Estado e os outros. Perde-se o poder de escolha, se a divisão social e de trabalho se realiza pelo mercado no sistema capitalismo, no socialismo essa dinâmica é determinada exclusivamente pelo Estado. Com essa imposição, pode-se considerar que todas as demais liberdades soam ilusórias.
É demonstrado nesse capítulo a iminência de um conflito inconciliável de interesses e uma possível volta do “sistema de castas” nessa política econômica, considerando a proibição de determinadas escolhas, e a dependência de uma aprovação para mudança de status através do exercício do trabalho. Um exemplo limitante abordado por Mises é a inibição de novas ideias, considerando que todas dependem de uma aprovação estatal para serem colocadas em prática, contrapondo a valorização pelo mérito num sistema de mercado. Somos levados a imaginar a vida em um cenário de estagnação cultural e material.
A abordagem sobre a impossibilidade de precificação também possui destaque nesse capítulo. Se abolíssemos a autorregulação do mercado, como seria possível identificar quais seriam os preços de produtos e serviços requisitados pela sociedade? Segundo o autor um tabelamento imposto e “racional” sempre será superficial e acarretará inevitavelmente a inflação, evento econômico discutido nos capítulos seguintes.
Os capítulos sobre intervencionismo e inflação se misturam, tendo em vista a intertextualidade dos temas. No início o autor deixa clara uma premissa liberal sobre o que seria o trabalho do governo: “proteger seus indivíduos de pessoas que agem de má fé, bem como de inimigos externos do bem comum”.
Dessa forma, quando o governo põe em prática políticas econômicas de encontro a esses princípios, com ações de intervencionismo que influenciam no preço dos produtos, por exemplo, o resultado sempre será trágico, especialmente em países que não possuem o “luxo de errar”, dada a forma com que essas políticas desconsideram toda a cadeia de eventos que influenciam nos valores, em conjuntos das reações regulatórias e dinâmicas que pertencem ao mercado.
Outro ponto abordado nesses capítulos é quanto a necessidade do custeio do governo, deve advir exclusivamente por meio da taxação via impostos, sendo a “criação de dinheiro” por parte do Estado, para inibir aumento na tributação, uma política premeditada para inflação inadequada.
Considerando que a inflação desmedida é um efeito econômico ruim a todos, todos querem uma maneira miraculosa e de rápida solução a esse problema. Mais fácil pensarmos que estamos a depender da “boa vontade” de alguém para agir, do que entendermos todo o fenômeno econômico e de mercado que a resulta e como também a autorregula.
No quinto capítulo do livro, Misses discute como, por meio do investimento estrangeiro, existe a capacidade preponderante de um país em ter auxílio de outros para financiar seu desenvolvimento e elevar sua capacidade de capital com novas ideias e tecnologias, resultando em melhores condições a todos. Contudo, num contexto mundial em que existe a possibilidade de expropriação de certos investimentos, o ambiente torna-se instável. Com a riqueza de exemplo históricos, o autor discute como essa circunstância atinge a fluidez dessa dinâmica pela falta de confiança. Um exemplo interno que segue essa mesma linha de confiança, é o investimento em poupança por parte dos cidadãos de um país versus instabilidade monetária local.
Sendo impossível desassociar política e economia, o livro se encerra com um capítulo que aborda sobre como partidos políticos vem sendo ferramentas de “grupos de pressão”. É discutida a forma com que esses grupos pressionam e requerem certos privilégios em detrimento de outros, fazendo com que a política deixe de ser para totalidade dos cidadãos e passe a ter medidas “focais”, considerando o espaço que conseguem conquistar a partir da ineficiência legislativa, e acabam promovendo um ambiente inábil ao desenvolvimento.
Mesmo havendo considerações sobre a possibilidade de nossa civilização estar em “deterioração”, Mises finaliza sua obra com um pensamento otimista e, para esse caminho de esperança, reforça o dever de todos em proteger os princípios liberais, na constante luta contra confiscos e controle de preços, sendo a defesa da economia livre a grande lição para o desenvolvimento social.