Resenha Crítica – Por Hermes Vinícius Fim, Associado Trainee do Instituto Líderes do Amanhã
Ludwig Von Mises foi um dos mais notáveis economistas do século XX, nascido em 29 de setembro de 1881, na antiga Áustria-Hungria. No início de sua juventude, Mises tinha a mentalidade de um intervencionista defensor do Estado, até o momento que ingressou na Universidade de Viena para cursar Direito e teve acesso ao livro “Princípios da Economia Política”, de Carl Menger, sendo seu primeiro contato com Escola Austríaca de Economia, que o introduziu para se tornar um adepto do liberalismo. Em 1919, lançou sua primeira obra, intitulada “Nação, Estado e Economia”. Fugindo dos ataques nazistas, Mises chegou aos Estados Unidos em 1940, onde, em 1949, publicou a que é considerada sua mais importante obra, “Ação Humana: Um tratado de Economia”. Ao longo de sua trajetória, Mises, conhecido como “o último cavaleiro do liberalismo”, escreveu seu nome como um dos maiores economistas do século XX, fruto de suas obras e vivências com grandes nomes, como Milton Friedman, Henry Hazlitt e Friedrich Hayek.
Mesmo após seu falecimento, em 1973, Mises continuou deixando seu legado: um grande exemplo é o livro “As Seis Lições”, publicado originalmente em inglês no ano de 1979, a obra foi organizada por Margit Von Mises, que transcreveu, na integra, seis palestras ministradas por seu esposo Ludwig. Essas palestras aconteceram na Argentina em 1958, direcionadas para centenas de estudantes argentinos e estão dividas nos temas que nomeiam os seis capítulos do livro: capitalismo, socialismo, intervencionismo, inflação, investimento estrangeiro e política e ideias.
A primeira lição trata sobre o capitalismo, na qual é feita uma breve contextualização histórica de como foi o surgimento do capitalismo, em que pequenos grupos, não pertencentes a classe privilegiada, começaram a se unir e produzir bens mais baratos, focados em satisfazer a necessidade de todos, principalmente das classes menos abastadas. Mises reforça que quem manda no mercado é o cliente e as empresas que esquecem de olhar para os desejos do cliente e suas mudanças de necessidade, podem se tornar obsoletas e substituídas por negócios novos e inovadores. Como ponto alto dessa primeira lição, cabe citar o aprendizado que Mises deixa, ao mostrar que, conforme o capitalismo evoluía, crescia simultaneamente a qualidade de vida da população, sendo os clientes aqueles que mais se beneficiam com esse sistema.
Na segunda lição, que aborda sobre o socialismo, Mises faz uma profunda reflexão a respeito do que realmente é liberdade, deixando claro que o indivíduo tem a liberdade de fazer o que entender ser melhor para si, seguir seus desejos, ser o dono de seu próprio plano, e também deve ter liberdade para cometer seus erros. O autor defende ainda que o governo não deve tomar ações com o intuito de proteger as pessoas, pois cada um é dono de si, e essas práticas só resultam na limitação de todas as formas de liberdades, já que não é possível querer que o governo atue limitando um tipo de liberdade, como a econômica, sem afetar as demais. Assim, quando os governantes ditam as regras do mercado, eles irão acabar ditando as suas escolhas e tomando, mesmo que não perceptível em um primeiro momento, as decisões fundamentais de sua vida. Dessa forma, é necessário que a economia de mercado prevaleça sobre os princípios econômicos socialistas.
Os primeiros passos rumo ao socialismo se dão quando o governo começa a interferir no mercado. É isso que Mises discorre em sua terceira lição, com o tema intervencionismo. Para o autor, a função do governo deve se restringir à preservação da ordem, quando ele executa qualquer outra atividade que não seja essa, acaba praticando intervenção. O exemplo mais conhecido é o controle de preços: quando os governantes julgam que devem proteger o cidadão de preços que o próprio governo considera abusivo, então cria o tabelamento de preços e limita os valores cobrados pelos comerciantes, isso é o que se vê, o que não se vê é que colocando um teto de preço em uma determinada mercadoria a sua produção certamente irá se tornar inviável e o resultado final será escassez de produto no mercado e o consumidor, ou seja, quem o governo queria proteger inicialmente terá sua liberdade de consumo restringida.
Entretanto, tabelamento de preços é muito adotado por governos do mundo inteiro, em especial nos momentos de inflação, a quarta lição abordada na obra. Mises define inflação como a desvalorização do dinheiro e, dessa forma, a elevação dos preços. O governo, para custear suas despesas e manter, ou aumentar sua estrutura, normalmente obtém dinheiro de duas formas, recolhimento de impostos ou impressão de dinheiro. Em um primeiro momento, a cobrança de impostos é uma medida menos popular e não faz bem para o ego do governo, principalmente o populista, em comparação com a impressão do dinheiro, pois a população sente os impostos de imediato, já a impressão de papel-moeda só é sentida após determinado tempo. Dessa forma, os governantes fazem uso da impressão de dinheiro, aumentando seu volume em circulação, sem proporcionar aumento na produção, resultando em aumento da demanda superior ao aumento da oferta de itens no mercado. A procura, sendo maior que a oferta, valoriza os itens e ocasiona o seu aumento de preço, essa elevação vai ocorrendo em escala de item para item até abranger o mercado em geral, fazendo com que toda a população perceba o aumento de preços e a inflação seja estabelecida, com isso, os primeiros a usufruírem do montante impresso pelo governo se beneficiam pelo fato de terem consumido itens que ainda não haviam sido atingidos de forma significativa pela crescente dos preços.
Ao tratar sobre investimento estrangeiro na quinta lição, Mises esclarece caminhos fundamentais para a riqueza de uma nação. O primeiro seria o acumulo de dinheiro através da poupança interna, para que a própria nação invista em si e promova a evolução de suas indústrias e serviços. O segundo seria a Nação abrir suas portas para receber o dinheiro estrangeiro em forma de investimentos, contribuindo, de maneira mais rápida que a poupança interna, para que o país consiga aumentar a produtividade de seu mercado e, assim, produzir mais e ter maior eficiência em seus processos, possibilitando que a renda média dos habitantes daquele país cresça. Porém existem governantes que ainda não compreenderam a importância de ter um ambiente nacional atrativo ao investidor externo, e querem esse aporte sem abrir mão do protecionismo, utilizando de artimanhas como a expropriação do capital estrangeiro. Quanto mais a visão socialista e intervencionista cresce em uma nação, menor serão as chances dos indivíduos que nela habitam de ter uma qualidade de vida comparável com a de países desenvolvidos e que praticam o livre mercado.
Na sexta lição, na qual Mises traz a reflexão sobre política e ideias, é possível compreender que o parlamentarismo surgiu com boas intenções, mas ao longo de sua história, foi sendo corrompido por grupos de interesse. Mises mostra como as ideias são uma poderosa ferramenta e que os intelectuais auxiliaram no fortalecimento de ideias intervencionistas. Portanto, o escritor deixa claro que é necessário combater as más ideias e substituí-las por ideias melhores, trazendo a célebre frase “Ideias, e somente ideias, podem iluminar a escuridão”.