Resenha Crítica – Por Marina Parreiras Vieira Alves Rebouças, Associada Trainee do Instituto Líderes do Amanhã
Literatura básica para aqueles que se interessam por liberalismo econômico, “As Seis Lições” expõe as reflexões colocadas por Mises em uma série de palestras ministradas na Argentina em 1959. Os pensamentos compartilhados no livro por sua esposa se apresentam de forma instigante, já que o economista investiga princípios fundamentais e oferece insights que até hoje são relevantes para entender o cenário econômico. Dessa forma, são abordados dos temas mais simples até os mais complexos de economia, sempre expostos com exemplos práticos.
A obra se inicia estabelecendo os princípios básicos para entender políticas econômicas, associando crenças conhecidas da escola austríaca. À medida que o livro se desenvolve, o autor, de forma extremamente habilidosa, é capaz de associar conceitos técnicos com casos reais e exemplos extremamente relevantes, fazendo com que ideias complexas se tornem acessíveis até para aqueles que não possuem familiaridade com estudos econômicos. O livro abrange diversos conceitos, fazendo o leitor refletir sobre temas simples como a origem do dinheiro e do empreendedorismo, até os mais complexos como os perigos que as políticas intervencionistas oferecem para seus países.
A escrita da obra é articulada e engajadora, fazendo com que as teorias mais complexas abordadas no livro sejam acessíveis a todos que tiverem interesse em aprofundar seus estudos no tema. É com maestria que Mises explora as implicações de políticas intervencionistas, ilustrando como essas são capazes de distorcer as forças e índices de mercado, além de perturbar a ordem natural dos processos econômicos. O comprometimento do autor com a liberdade individual e a economia de mercado é nítido a partir da forma como ele argumenta de forma tão vigorosa pela autonomia econômica.
Seria impossível avaliar o livro sem abordar as seis lições em si, afinal é a partir delas que Mises expõe todos os pontos mencionados. Na primeira lição, o autor descreve o capitalismo e como ele chegou ao formato que conhecemos hoje. Nessa lição, é possível já notar o tom furtivo do livro, em que são refutadas diversas ideias de senso comum sobre o capitalismo, mas que não necessariamente são verdadeiros. De acordo com o autor, o modelo econômico que vivemos hoje foi vital para sustentar o crescimento orgânico da população com os recursos disponíveis para a sociedade.
Na segunda lição, Mises explora as falhas do socialismo. Apesar de já conhecidas, o autor é capaz de explicar profundamente e de forma concisa o motivo de esse sistema não funcionar e como ele acaba trazendo mais malefícios do que benefícios para aqueles que estão inseridos nele. É nessa porção do livro que o autor explora mais sobre a liberdade individual – e que apesar da sociedade ter objetivos em comum, o indivíduo não pode ser ignorado nessa equação e, se for, o todo também será prejudicado. Além disso é abordado pela primeira vez o tema de intervencionismo, que será aprofundado nas lições seguintes.
Ao chegarmos à terceira lição, o autor já definiu o tom da conversa que tem com os leitores e aqueles que escutavam as palestras. Mises expõe como o Estado falhou em suas diversas tentativas de suportar a sociedade; como a prática de controle de preços, por exemplo, e sua sucessiva falha em diversos cenários diferentes. Mises ainda ousa em dizer que a prática do livre mercado dificilmente solucionará os problemas gerados por essas práticas, considerando os precedentes que as políticas intervencionistas geraram – ele traz o exemplo do controle de aluguéis em Berlim e como a decisão de décadas atrás ainda afetam os habitantes da cidade até os dias de hoje.
A quarta lição aborda termos mais técnicos. Com o tema de inflação, o autor inicia explicando sobre o conceito em si, e como o índice de preços funciona. Mises sugere que o fenômeno não é algo natural do capitalismo, mas sim derivado de uma política do Estado. É de entendimento geral que essa seja a lição mais ignorada das propostas, já que até hoje são poucos os adeptos. Já a quinta lição trata de investimentos externos: onde o autor propõe que os países possuem padrões diferentes em nível de qualidade de vida não pelas características da população, mas sim devido à disponibilidade de renda de cada região. O objetivo das nações deve sempre ser o acúmulo de capital, a fim de deixar o país e seus habitantes mais produtivos – vindo a terem melhor padrão de vida.
Finalmente, a sexta e última lição de Mises diz respeito á intervenção governamental na economia e como esta é em suma motivada por políticas que mais beneficiam os partidos do que os indivíduos. O autor critica o sistema político partidário que vivemos hoje, expondo como eles não incentivam o bem-comum e sim os interesses de certos indivíduos e grupos específicos e como isso claramente não é positivo para a sociedade.
Uma das razões pelas quais o faz tanto sucesso recai especialmente na habilidade de Mises de destilar a complexidade das teorias econômicas compartilhadas nessa série de eventos. Seus argumentos não são somente opiniões, mas sim sustentados por um rico background em exemplos históricos, reforçando ainda mais a relevância do que é proposto em seu discurso. A defesa do autor sobre como o livre mercado é a melhor opção para a distribuição ideal de recursos em uma sociedade se destaca como uma argumentação persuasiva e impactante.
Enquanto o economista tem uma exímia análise das aplicações do livre mercado, o livro peca na extensão do assunto. A postura muito firme de Mises sobre o tema pode ser interpretada como uma atitude “laissez-faire”, uma vez que o autor, apesar de explorar os benefícios da premissa, acaba deixando de expor como a sociedade pode atingir o nível proposto de economia de mercado. Além disso, por mais que se almeje atingir um Estado, em que não há necessidade de intervenção governamental na economia, o conceito beira o utópico e idealista.
Apesar disso, a leitura do livro “Seis Lições” gera uma reflexão no leitor sobre a intrínseca relação entre o governo e a economia, e o papel deste primeiro no desenvolvimento harmônico do mercado. Mises enfatiza diversas vezes ao longo da obra sobre as escolhas individuais do ser humano e incentiva o leitor a reconsiderar as ideias que possui sobre economia de mercado e governança. O livro pode ser considerado um catalisador de diversos pensamentos e teorias aplicadas nas últimas décadas e gera um entendimento mais profundo sobre as consequências de misturar política com economia.