Resenha Crítica – Por Matheus Gonçalves, Associado III do Instituto Líderes do Amanhã
Frederic Bastiat, um dos mais proeminentes defensores do liberalismo clássico do século XIX, escreveu uma obra atemporal que continua a ressoar em nossos dias tumultuados: “A Lei” (La Loi).
Nesta obra, escrita em um momento muito delicado da história da França, quando o país via aumentar a propagação de ideias socialistas e populistas contrárias à liberdade e ao respeito aos direitos fundamentais defendidos pela escola liberal clássica, Bastiat tece uma análise perspicaz sobre a natureza da lei, seus propósitos legítimos e os perigos que surgem quando ela é deturpada para servir interesses particulares em detrimento do bem comum.
Antes de adentrar nas ideias centrais de “A Lei”, é fundamental compreender o contexto e a trajetória do autor. Frederic Bastiat, nascido em 1801, testemunhou as turbulências políticas e sociais da França do século XIX, incluindo os efeitos devastadores das políticas protecionistas sobre a economia.
Inspirado pelos pensadores liberais de sua época, Bastiat dedicou sua vida a promover os princípios do livre mercado, da propriedade privada e da liberdade individual.
“A Lei” é uma obra seminal que destaca a distorção do propósito da lei quando esta é utilizada como instrumento de coerção para beneficiar determinados grupos em detrimento de outros. Bastiat argumenta que a verdadeira função da Lei é ” a organização coletiva do direito individual à legítima defesa. Cada um de nós tem o direito natural — daí o direito divino — de defender a sua pessoa, a sua liberdade e a sua propriedade”
No entanto, ele observa que, ao longo do tempo, a lei tem sido pervertida para servir interesses particulares, resultando em uma multiplicação de privilégios, subsídios e regulamentações que distorcem o funcionamento natural da economia e minam a liberdade individual.
Essa análise de Bastiat ressoa de forma impressionante nos dias de hoje, especialmente diante da situação política e econômica do Brasil. No contexto brasileiro contemporâneo, se observa claramente a presença de grupos de pressão (corporativistas, políticos, ativistas, dentre outros) que atuam incessantemente para moldar a legislação em seu próprio benefício, muitas vezes às custas do bem-estar da sociedade como um todo.
Um exemplo flagrante disso foi durante a pandemia de Covid-19, quando grupos de servidores públicos conseguiram, mesmo diante das necessidades do governo de cortar gastos, assegurar a manutenção integral de seus salários, mesmo para aqueles que estavam em regime de trabalho remoto ou simplesmente sem atividades, enquanto o setor privado enfrentava demissões em massa e reduções salariais para sobreviver à crise econômica.
Bastiat certamente apontaria essa situação como um exemplo da deturpação da lei em benefício de interesses particulares. Ao invés de proteger os direitos individuais e garantir a igualdade perante a lei, o sistema legislativo é frequentemente utilizado como ferramenta para a promoção de privilégios e vantagens injustas para certos grupos, criando desigualdades e distorções no tecido social.
Além disso, a análise de Bastiat sobre os efeitos perversos das políticas protecionistas e intervencionistas ressoa de forma contundente na realidade brasileira, onde medidas como subsídios excessivos, barreiras comerciais e regulamentações burocráticas frequentemente prejudicam a eficiência econômica e restringem o desenvolvimento do país.
Há setores na economia brasileira que sobrevivem há décadas de subsídios concedidos pelo governo, o que provocou um duro cenário em que, basicamente, acabaram “protegidas” da concorrência, deixando de inovar e garantia a própria competitividade no mercado.
No entanto, “A Lei” não se limita apenas a diagnosticar os problemas da sociedade, mas também oferece uma visão positiva e construtiva para a restauração da ordem e da liberdade. Bastiat defende veementemente a primazia da liberdade individual, da propriedade privada e do livre mercado como os fundamentos de uma sociedade justa e próspera.
Ele argumenta que, ao restringir o papel do governo à proteção dos direitos individuais e à aplicação imparcial da lei, é possível evitar os abusos e distorções que resultam da intervenção excessiva do Estado na economia e na sociedade.
Assim, ao refletir sobre as lições atemporais de “A Lei”, de Frederic Bastiat, e sua relevância para o contexto contemporâneo brasileiro, somos instados a repensar o papel da lei e do governo em nossa sociedade.
É necessário esforço para garantir que a lei sirva ao interesse público e promova a justiça, em vez de ser manipulada para satisfazer os caprichos de grupos privilegiados. Somente através do respeito aos princípios da liberdade, igualdade e justiça se poderá construir uma sociedade verdadeiramente livre e próspera.
Essa é a lição que Frederic Bastiat, escrita há mais de 150 anos, e que continua mais atual que nunca.